domingo, 4 de setembro de 2022

CURTINDO O AMANHECER EM PERUÍBE NUM DIA INVERNAL (CONTO) - SETEMBRO DE 2022




"O que preocupa você, domina você." - John Locke


Era uma manhã fria de sábado, quando a última garota foi caminhar pela praia. Ela e o namorido resolveram visitar Peruíbe no primeiro fim-de-semana de setembro, e ficaram na casa dos pais dele, localizada no lado praiano do centro (a parte próxima da orla). Fez um passeio solitário, enquanto sentia uma baixa temperatura (para o padrão climático peruibense) e via no morro um cenário futuro de chuva se anunciando. Aliás, era a primeira vez que visitava a cidade, em cerca de dois anos. Pois é, dois longos anos.

A agora distante Curitiba tinha se tornado seu lar, e a terra do sol poente um local de boas e tristes lembranças, onde vários de seus parentes seguiam morando. Retornar continuava sendo uma ideia tola, pois se sentia bem na famosa metrópole sulista. Um bom emprego, apartamento confortável próximo ao local de trabalho, novas e boas amizades, e a companhia de alguém que desistira de Peruíbe para ir viver ao lado dela, tudo isso ela valorizava. Mas a saudade prosseguia insuperável.

A condição de peruibana (nascida na terra, de acordo com os caiçaras) alimentava esse sentimento, mas tanto para ela quanto para o amado, um retorno não seria prático, apesar de todas as mudanças que testemunhou, desde a noite de sexta-feira, quando chegou.

Nas recentes conversas ao vivo com familiares e amigos, ninguém mencionava a palavra pandemia, e era evidente uma grande mudança no comércio local. Lojas novas e movimentadas, mais carros nas ruas e um visível aumento populacional, ou seja, mais gente ficando do que indo embora, e outros vindo. Com a recuperação econômica do país também atingindo aquele recanto do litoral paulista, estaria a tão aguarda prosperidade, sonhada por tantos moradores, finalmente chegando?

Foi o que perguntou para si própria, após quase madrugar para ver o sol nascer na praia. No curto caminho, reparou em casas que sabia serem velhas sendo reformadas, outras novinhas ocupando terrenos que até pouco tempo atrás estavam cobertos de mato, e carros novos estacionados nas garagens. Quando migrou, a paisagem urbana por ali não era tão agradável, muito pelo contrário. A cidade já tinha mudado tanto desde que tinha partido, que se tivesse demorado mais para visitá-la, provavelmente acharia algumas partes dela irreconhecíveis, e isso num sentido positivo. Então entendeu que um novo tempo, marcado pela reconstrução social e urbanística da terra em que nasceu tinha de fato chegado. 

Mas algo a preocupava: e se tudo mudasse para a pior? Na capital paranaense, ela e uma colega de trabalho (a garota do sonho) conheceram num restaurante uma argentina, que não lhes disse boas coisas, sobre o governo do país do qual resolveu imigrar, tendo se mudado para a vizinha Santa Catarina. A amiga de Florianópolis também contou sobre o número crescente de portenhos que trocavam Buenos Aires pela ilha da magia. Os hermanos fizeram uma escolha sinistra com um resultado igualmente sinistro. E sabia de gente no lado de cá da fronteira, defendendo uma mudança similar. Tudo o que ela e o companheiro tinham conseguido até aquele momento, não foi sem dificuldades, e um evento marcado para ocorrer dentro de exatamente um mês, lhe preocupava um bocado.

Segundo uma piada que tinha lido em uma rede social, no próximo dia dois de outubro, os eleitores decidiriam se viveriam em um país no qual prosseguiriam passeando com os cães, ou se mais adiante lhes destinariam um fim "culinário", tal como aconteceu numa nação vizinha mais ao norte. E agora, o que aconteceria mais adiante, com os pets e os donos dos mesmos?

E a última garota prosseguiu nesses pensamentos, escutando música e admirando o mar, quando o o celular tocou. Era o amado:

"E aí? O café está pronto, e já busquei pão e queijo", avisou o rapaz, que ela tinha deixado dormindo. "A praia tá tão boa, assim?", perguntou.

"Sim, está ótima, e já vou voltar. Ah, tem uma coisa: você vai mesmo naquela manifestação do sete de setembro, em Curitiba?"

"Sim, é claro que vou. Isso é decisivo. Ou a gente mostra força, ou perde o país. Ah, até aqui em Peruíbe têm preços em promoção no mercado!", disse em tom de galhofa. "Só quero que isso prossiga, simples assim."

"Então, eu também vou", ela disse.

"Você nunca ligou pra política", respondeu o rapaz. Está preocupada com a situação?"

"Estou sim. Quero o melhor para nós dois, e para todo mundo. Diga aos teus amigos que vou participar. E acha que vou te deixar sozinho no meio daquelas bonitonas? Nem pensar", concluiu, e desligou, antes do rapaz dizer mais alguma coisa. E assim, voltou para a residência dos sogros, pensando em convidar os pais para passarem o dia da independência juntos, pois entendeu a importância daquele dia futuro, para todos ... e para o Brasil.




Para rir um pouco (depois da eleição eu mudo de vídeo, tá ok?)


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MARCADORES: INVERNO EM PERUÍBE, AMANHECER NA PRAIA, FRIO, 7 DE SETEMBRO, DIA DA INDEPENDÊNCIA, PÁTRIA

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