terça-feira, 21 de agosto de 2018
UMA FAMÍLIA PERUIBENSE EM CURITIBA: A CRÔNICA DE UMA MIGRAÇÃO - AGOSTO DE 2018
Ela era a última, caçula de três irmãos, que continuava a morar em Peruíbe. Certa manhã, decidiu fazer o mesmo que os manos: iria finalmente trocar a terra do cação pela distante terra do pinhão.
O mais velho, hoje um marceneiro bem-sucedido com 35 anos, partira uns dez anos atrás, fugindo de um lugar onde a chance de ter o próprio negócio parecia um sonho impossível. Aprendera o ofício com sacrifício, indo à pé até a marcenaria do patrão (mais adiante, comprou uma bicicleta usada), saindo cedo duma rua no Caraguava, em área onde são comuns os alagamentos. Ser pedreiro como o pai não estava em seus planos. Via no trabalho com madeira um caminho para ser patrão de si mesmo mais adiante, e nisso o tempo lhe deu razão, mas o sucesso não seria possível na cidade em que nasceu. Optou em se mudar para a capital do Paraná, onde também passou a morar num subúrbio, mas tinha perspectivas, condições reais para aumentar a própria renda.
O irmão do meio, partiu uns seis anos depois, convidado pelo mano mais velho, então já casado com a namorada - também daqui - e pai de dois filhos curitibanos. Três anos mais novo do que o primeiro, o rapaz se sentia um inútil fazendo "bicos", e não teve uma boa experiência como plantonista em algumas imobiliárias, além de outras ocupações com resultados medíocres. Cansado das cobranças familiares, de que ele precisava arrumar um emprego (como se não soubesse!) num lugar lotado de desempregados, topou o convite e caiu fora também.
A primeira semana na maior metrópole paranaense foi uma combinação de contentamento e estranheza. Os confortáveis ônibus vermelhos; as inusitadas estações tubo; a descoberta, numa conversa com um dos piás locais, de que falava "rapidinho"; o primeiro emprego, de repositor numa rede de supermercados, e com um contrato formal de trabalho, fato incrível para alguém acostumando com a informalidade, o fizeram concluir que a amada terra da eterna juventude, era para ele a terra do eterno desemprego. No início dormia no quarto dos sobrinhos e ajudava nas despesas da casa, até construir, no mesmo terreno, o próprio teto, com luz e água separados, e uma moça local como companheira.
Alguns aniversários após a maioridade, a irmã mais nova se cansou também. Completou o ensino médio, fez vários cursos e concursos, e foi a única da família a estudar numa faculdade, paga pelo primogênito do trio. Porém o vazio de oportunidades onde morava teve um preço. Foi balconista em supermercado, manicure, cabeleireira, mas sem exercer a carreira em Letras, a profissão para a qual tinha tanto estudado. Não tinha jeito, resolveu seguir o caminho dos manos.
Numa manhã fria e chuvosa de julho ela partiu, após embarcar num grande ônibus branco que se destacava na rodoviária. Os pais, ambos aposentados, se emocionaram, mas sabiam que não tinha jeito. Que futuro a filha teria se continuasse nesta cidade? Foi a melhor escolha, tal como fizeram os outros.
A viagem foi agradável, pois as paisagens por onde passa a Régis Bittencourt costumam ser deslumbrantes, e o frio na chegada bem mais severo. O irmão do meio foi buscá-la na rodoviária, e foram de carro até um bairro que ela já conhecia de várias visitas, e agora lhe parecia mais bonito.
Com 25 anos, aquela bela e jovem mulher começou em Curitiba uma nova etapa da vida. Logo, arrumou um trabalho modesto, enquanto buscava oportunidades para lecionar. Certa noite, bebendo chá na tranquilidade do quarto, localizado na casa do irmão mais velho, viu a chuva gelada lá fora, e se lembrou dos verões calorentos, e das diversões na praia. Pensou nos pais, que já planejavam se mudar para lá também, após a venda da única casa, e se deu conta de que em pouco tempo Peruíbe seria para ela um local distante que raramente voltaria a visitar, pois até os primos e tios pretendem seguir o exemplo deles, alguns até sonhando em passear pelas ruas do Batel, que só conhecem através de vídeos e relatos.
Para essa família, Peruíbe tende a se tornar o passado, e Curitiba o futuro.
MARCADORES: CIDADE DE CURITIBA, CAPITAL DO PARANÁ, TERRA DO PINHÃO, PERUÍBE, PERUIBENSES EM CURITIBA, MIGRAÇÃO, MIGRANTES, INVERNO DE 2018
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