“ - Um homem que está se afogando se agarrará a uma palha."
- provérbio japonês
- provérbio japonês
No dia da independência, o rapaz das entregas e seu pai resolveram visitar um lugar em Curitiba no qual ainda não tinham botado os pés: a praça do Japão. A mãe dele e os dois irmãos tinham aproveitado o feriadão (coincidentemente, ela estava de férias do trabalho no supermercado) para visitarem parentes em Peruíbe. Então sozinhos e sem muito o que fazer naquele feriado, a dupla de proletas partiu pra fazer turismo, chegando ao desejado local num vermelhão.
"Se tivéssemos vindo para cá no início de julho, estaríamos vendo a floração das cerejeiras. Vi em fotos o quanto elas ficam muito bonitas, bem no pico do inverno", disse o pai.
"Aquelas que estão no calçadão da XV de Novembro também estavam muito bonitas no mês retrasado - respondeu o filho - e também têm muitas delas nas calçadas da avenida desta praça. Mas entendi o que você quis dizer. Elas ficam visualmente melhores num lugar como este, do que plantadas nos canteiros de alguma rua."
"Já reparou numa coisa? A avenida daqui se chama Sete de Setembro, data que virou feriado nacional por causa de um sujeito que virou Dom Pedro I no Brasil e anos depois de se tornou Dom Pedro IV lá em Portugal. Cara ... Dom Pedro IV? Deve ter sido por causa do fuso horário, sacou?"
O filho balançou a cabeça ante a piadoca do progenitor, e considerando o tempo em que viviam, fez a seguinte pergunta, um questionamento inevitável, enquanto caminhavam, perto de um lago onde podiam ver carpas de cores variadas:
"Está começando o nono mês do desgoverno, e até agora, o povo quase não tem ido para as ruas. Em junho teve a piazada que foi protestar por causa do deputado que foi cassado, mas fora isso, cadê as pessoas? Aquele domingo de janeiro abalou tanto assim?"
"Sem dúvida que abalou. Muitos que se dizem patriotas ficaram assustados e desorientados, desde aquele domingo. O medo se espalhou, mas mesmo isso não vai deter os descontentes pra sempre, basta a gente ver o que está acontecendo no nordeste, com prefeitos fazendo greve por causa da queda do repasse do fundo de participação dos municípios. E eles não são poucos. Com as contas federais estourando, tá faltando dinheiro, simples assim."
"Peraí, pai! Tanto esses prefeitos quanto vereadores de lá que estão reclamando fazem parte da turma que fez o L, e com gosto. Nem dá pra dizer que se arrependeram, o papo deles é o do 'morde e assopra', e bem de leve. Basta que voltem a receber as verbas, nos valores de antes, e até elogiarão o nine por "salvar" as prefeituras de uma quebradeira, ou seja, nada vai mudar."
"Aí que você se engana, garoto. Um dos motivos desses políticos terem preferido o L, foi pela crença de que o atual presidente mandaria mais recursos para as prefeituras deles, o que até agora não aconteceu, ou seja, o Barba decepcionou muita gente justamente na região do Brasil onde ele tem maior eleitorado. E quanto mais esse infeliz demorar pra resolver isso, maior será o descontentamento, pois já estão ocorrendo demissões. Socialismo só é bacana pra quem se diz progressista mas não tem a geladeira vazia."
"Então, como será o nosso futuro próximo? Uma nova Argentina ou Venezuela? Muita pequena empresa já faliu, até aqui no sul."
"Depende do quanto a reação ao que está acontecendo demorar. Não é só questão de medo, mas de comodidade. Claro que com o padrão de vida piorando, a sensação de incômodo crescerá, diminuindo entre o povão o temor de se manifestar publicamente. E no caso de muitos nordestinos, o medo da crítica por se afastarem do pai dos pobres se enfraquecerá, pois encontrarão outros que assumirão publicamente esse sentimento, ou seja, não se sentirão isolados. E olha que não estou sendo otimista."
Cansados de discutir mazelas nacionais, os dois seguiam caminhando pela praça, admirando uma área pública baseada na cultura de uma terra distante, o famoso país do sol nascente, sede da monarquia mais antiga do mundo.
O pai do rapaz falou da época em que os animes eram apenas chamados de "desenhos japoneses" (o que de fato são), muito populares entre a molecada setentista e oitentista, quando só existia a TV aberta. De forma saudosa, contou um pouco sobre as lutas de Sawamu, as aventuras de Pinóquio, os poderes de Fantomas, a inacreditável saga de Marco em busca da mãe, os sofrimentos de Heidi, as corridas de Speed Racer, o heroísmo da Patrulha Estelar, para ficar só nisso, tudo enquanto caminhavam por um local que causava neles um misto de estranheza, admiração e inspiração. E como bons patriotas, aceitaram a recomendação de não assistirem os tradicionais desfiles do importante dia. Não ficaram em casa - como tantos outros, mas ambos curtiram aquela quinta-feira de liberdade buscando um enriquecimento cultural.
"Se tivéssemos vindo para cá no início de julho, estaríamos vendo a floração das cerejeiras. Vi em fotos o quanto elas ficam muito bonitas, bem no pico do inverno", disse o pai.
"Aquelas que estão no calçadão da XV de Novembro também estavam muito bonitas no mês retrasado - respondeu o filho - e também têm muitas delas nas calçadas da avenida desta praça. Mas entendi o que você quis dizer. Elas ficam visualmente melhores num lugar como este, do que plantadas nos canteiros de alguma rua."
"Já reparou numa coisa? A avenida daqui se chama Sete de Setembro, data que virou feriado nacional por causa de um sujeito que virou Dom Pedro I no Brasil e anos depois de se tornou Dom Pedro IV lá em Portugal. Cara ... Dom Pedro IV? Deve ter sido por causa do fuso horário, sacou?"
O filho balançou a cabeça ante a piadoca do progenitor, e considerando o tempo em que viviam, fez a seguinte pergunta, um questionamento inevitável, enquanto caminhavam, perto de um lago onde podiam ver carpas de cores variadas:
"Está começando o nono mês do desgoverno, e até agora, o povo quase não tem ido para as ruas. Em junho teve a piazada que foi protestar por causa do deputado que foi cassado, mas fora isso, cadê as pessoas? Aquele domingo de janeiro abalou tanto assim?"
"Sem dúvida que abalou. Muitos que se dizem patriotas ficaram assustados e desorientados, desde aquele domingo. O medo se espalhou, mas mesmo isso não vai deter os descontentes pra sempre, basta a gente ver o que está acontecendo no nordeste, com prefeitos fazendo greve por causa da queda do repasse do fundo de participação dos municípios. E eles não são poucos. Com as contas federais estourando, tá faltando dinheiro, simples assim."
"Peraí, pai! Tanto esses prefeitos quanto vereadores de lá que estão reclamando fazem parte da turma que fez o L, e com gosto. Nem dá pra dizer que se arrependeram, o papo deles é o do 'morde e assopra', e bem de leve. Basta que voltem a receber as verbas, nos valores de antes, e até elogiarão o nine por "salvar" as prefeituras de uma quebradeira, ou seja, nada vai mudar."
"Aí que você se engana, garoto. Um dos motivos desses políticos terem preferido o L, foi pela crença de que o atual presidente mandaria mais recursos para as prefeituras deles, o que até agora não aconteceu, ou seja, o Barba decepcionou muita gente justamente na região do Brasil onde ele tem maior eleitorado. E quanto mais esse infeliz demorar pra resolver isso, maior será o descontentamento, pois já estão ocorrendo demissões. Socialismo só é bacana pra quem se diz progressista mas não tem a geladeira vazia."
"Então, como será o nosso futuro próximo? Uma nova Argentina ou Venezuela? Muita pequena empresa já faliu, até aqui no sul."
"Depende do quanto a reação ao que está acontecendo demorar. Não é só questão de medo, mas de comodidade. Claro que com o padrão de vida piorando, a sensação de incômodo crescerá, diminuindo entre o povão o temor de se manifestar publicamente. E no caso de muitos nordestinos, o medo da crítica por se afastarem do pai dos pobres se enfraquecerá, pois encontrarão outros que assumirão publicamente esse sentimento, ou seja, não se sentirão isolados. E olha que não estou sendo otimista."
Cansados de discutir mazelas nacionais, os dois seguiam caminhando pela praça, admirando uma área pública baseada na cultura de uma terra distante, o famoso país do sol nascente, sede da monarquia mais antiga do mundo.
O pai do rapaz falou da época em que os animes eram apenas chamados de "desenhos japoneses" (o que de fato são), muito populares entre a molecada setentista e oitentista, quando só existia a TV aberta. De forma saudosa, contou um pouco sobre as lutas de Sawamu, as aventuras de Pinóquio, os poderes de Fantomas, a inacreditável saga de Marco em busca da mãe, os sofrimentos de Heidi, as corridas de Speed Racer, o heroísmo da Patrulha Estelar, para ficar só nisso, tudo enquanto caminhavam por um local que causava neles um misto de estranheza, admiração e inspiração. E como bons patriotas, aceitaram a recomendação de não assistirem os tradicionais desfiles do importante dia. Não ficaram em casa - como tantos outros, mas ambos curtiram aquela quinta-feira de liberdade buscando um enriquecimento cultural.
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MARCADORES: BRASIL, FERIADO NACIONAL DO 7 DE SETEMBRO, DIA DA INDEPENDÊNCIA, PRAÇA DO JAPÃO EM CURITIBA, CONTO LITERÁRIO, 7 DE SETEMBRO DE 2023
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