sábado, 13 de julho de 2013

A VERDADE POR TRÁS DA IMPORTAÇÃO DE MÉDICOS ESTRANGEIROS



A recente polêmica sobre a possibilidade de médicos estrangeiros virem clinicar no Brasil acende luzes sobre o modo como o nosso país tem sido governado desde sempre, e lamentavelmente essas luzes já não são mais amarelas de advertência, mas vermelhas, indicadoras de chances e gerações perdidas pelo pouco caso e incompetência de políticos e administradores. 

 Ao largo da questão da dispensa da prova técnica para exercer a medicina no SUS, como se o SUS não estivesse no Brasil, ou os seus usuários não merecessem atendimento de qualidade, se o argumento de que a medida é por conta de os médicos brasileiros não quererem ocupar postos no interior do país ou em áreas de risco, cabe a pergunta, evitando a questão da falta de condições e remuneração em certos locais do Brasil: Onde estão os profissionais que aceitariam esses trabalhos de bom grado? A resposta é simples: basta olhar para os guardadores de carros, os vigilantes, os porteiros e imaginá-los vestidos de branco e estetoscópio no peito. Esse é um exercício inquietante porque deixa muito claro tudo o que boa parte do nosso povo podia ser e não é. 

Não são os médicos que são arrogantes ou só querem a vida das cidades, são os governos que nunca foram capazes de atraí-los, e de tempos pra cá cada vez menos com a entrega de um serviço essencial a terceirizações e outras fórmulas que não garantem a eles qualquer segurança. Mas pior do que isso é constatar que nunca conseguiu também transformar em médicos os jovens de nosso país que tanto clamam por acesso a melhores condições de vida por meio de uma ascensão social honesta, baseada no trabalho. Faltam escolas, boas universidades, chances… 

 Diz-se que a questão é urgente, mas por que nunca foi urgente nos últimos vinte ou trinta anos? Será que esse é o argumento para de novo taparmos o sol com a peneira sobre essas questões? Por que ao invés de uma medida que desvaloriza toda uma categoria profissional, com milhares de integrantes, não se opta pelo que é o correto? Um incremento de qualidade na educação brasileira desde o ensino fundamental até o universitário com uma formação humana e acadêmica adequadas; vagas no ensino superior acessíveis às pessoas de baixa renda; novos hospitais e postos de saúde com a multiplicação de leitos disponíveis; a fundamental aquisição de equipamentos adequados para o exercício da medicina e finalmente, supremo pecado, a remuneração digna que mantenha estimulados esses profissionais que quando estão com nossos filhos em suas mãos são as pessoas mais importantes do mundo. 

 Por isso a importação de médicos estrangeiros é claramente inconstitucional, porque a medida gera mais prejuízos do que benefícios e dessa forma transgride o princípio da razoabilidade previsto no artigo 5º da Carta Magna. 

 Que urgência é essa se a política do governo federal é a mesma há mais de dez anos? Se ela for verdadeira o caso é o de sair de fininho, porque dez anos era mais que suficiente para que o cenário não chegasse a esse ponto, mas se a urgência não existir aquela retirada constrangida também é a solução pela desfaçatez da apresentação de um paliativo que continuará desperdiçando os talentos do nosso povo e empurrando toda a categoria médica para a beira do abismo. É por isso que a culpa da situação em qualquer caso é dos governos, e é por isso que só nos resta esperar que a sensatez e o sentimento de compromisso com o interesse público tome conta dos formuladores de políticas para que mais esse atentado não se imponha tanto àqueles que esperam uma chance, quanto para os que não merecem ficar mais desvalorizados do que já estão como integrantes de uma carreira sempre injustamente culpada por tudo de ruim que acontece no sistema de saúde brasileiro.


FONTE: FÁBIO SCLIAR

MARCADORES: PERUÍBE, PERUIBENSE, SUS, SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE, MEDICINA, BRASIL


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